sexta-feira, setembro 8

News from a distant place...

Não sei que horas são. Estou a ouvir o Sinatra, penso no Calvin, penso no mundo que podia existir se o Calvin realmente existisse, penso nos desenhos do Sérgio, penso no urso castanho claro com um ramo de flores que ele decidiu que queria como presente de boas vindas. Penso no dia de amanhã, no desejo de ter Internet novamente, no desejo de receber do D um e-mail, um telefonema, um postal, um indício de preocupação. Nunca sabemos o quanto os outros são importantes para nós, excepto quando se vão. Sinto um misto de resignação e decepção quando penso no silêncio dele. Resignação porque no fundo sempre soube que, mais cedo ou mais tarde, isso ia acontecer. E decepção misturada com tristeza porque apesar de tudo ele faz-me falta, o ser loira faz-me falta. Chego à conclusão que nunca cheguei a tocar ninguém, nunca influenciei ou agarrei ninguém nem mesmo com a minha amizade. Decepção misturada com um sentimento de inveja porque sei que ele está melhor que eu e porque tomo consciência que na assimetria que foi a nossa relação eu sempre fui a parte mais fraca, a menos capaz de funcionar neste mundo, a menos sofisticada, a mais necessitada de atenção. Carrego com isso no coração, com esta mágoa por um silêncio que não compreendo, que não consigo justificar, que me corrói a alma e me enfraquece os membros. Compreendo que não sou forte, R; vivo no limiar nas coisas, imersa em estados de humor extremos e corrosivos. Sou uma criança com vinte e seis anos de idade, amedrontada com tudo aquilo que ainda vai acontecer, com todas as perdas que ainda vou viver, com a ideia que tenho sangue a correr nas veias, e que é o medo e não a paixão ou a ousadia o motor que governa a minha vida.

Pedi à minha tia para me enviar arroz doce, pedi à minha mãe para me comprar café delta e à minha outra tia para me enviar o jornal e a Premiere. Receber correspondência continua a ser um deleite. Chegar a casa e receber um pouco do lar num pacote dos correios é uma satisfação. E quando se trata de livros é um delírio. Sei que estou aonde devo estar e sei que mudei a níveis que nem eu mesma percebo por completo. Mas o estar aqui, o reconhecimento do meu rosto neste país, exigiu-me o sangue e a alma. Sorrio, não só às pessoas que já fazem parte do meu dia-a-dia e que na sua imensa generosidade me perguntam sempre como estou, se estou bem, e me tocam e me abraçam, mas também sorrio interiormente na esperança que esse sorriso tímido me devolva a esperança, me cure a alma e me rejuvenesça por dentro. Uso frequentemente a expressão ‘yes, love’, como uma forma de quebrar o gelo, faço e digo coisas que há um ano seriam extravagantes e impossíveis. Já não sou uma miúda ou adolescente, antes sou perspectivada como uma adulta e resolução de todas as burocracias inerentes à minha estadia aqui depende apenas de mim.

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