quarta-feira, outubro 20

A Letter

Dear Friend

Parece que a década de noventa ocorreu há muito tempo atrás. Há tanto tempo que nem sequer me consigo lembrar de quem eu era em 1996. Estou a ouvir os GNR, numa espécie de homenagem a ti. Sim, tens razão quando dizes que são as pequenas coisas que nos sustentam quando nada mais sobra.
Sei que daqui a uma hora vou para a cama ver a série que passa na 2, sei que amanhã vou comprar o jornal e tomar café, de manhã cedo. Vou à aula de condução, nem que seja para me recordar que não percebo nada daquilo e que tenho que começar a fazer os testes o quanto antes. Sei que vou buscar o computador e se estiver com o Sérgio, vou-me chatear com ele concerteza. Mas no meio dos sorrisos e das arreliações que o meu monótono dia a dia produz, não consigo deixar de pensar que tudo isto é tão pouco. E não me refiro às coisas que podemos, pela nossa vontade mudar, mas sim aquelas que estão para além de nós, ou melhor que se encontram rentes à nossa pele, à nossa personalidade. Eu sei que não arranjo emprego porque não quero ou não me empenho, que não vou para fora ou investo no meu futuro académico, porque sofro de preguiça crónica. Mas por que raio não me deixa a minha personalidade depressiva e a minha falta de auto estima acreditar que as coisas mudam, que existe algum rapaz aí à minha espera, algum rapaz para me ajudar a carregar os sacos do supermercado? É aí, Raquel, é aí que as coisas não vão mudar. Refiro-me a essa facilidade nos relacionamentos e enamoramentos que muitos têm, mas que eu não tenho. Não vou ser feliz, porque duvido que encontre alguém, que me arrebata da minha medíocre existência. E claro que ninguém arrebata ninguém, porque não existem príncipes encantados, e porque tudo isso são sonhos de criança. Mas começo a achar que sem amor, ou paixão ou enamoramento a vida é simplesmente um grande vazio, que os livros, os sonhos e a esperança vão preenchendo. Sei que temos problemas existenciais e afins similares e sei tb que a vida, a nossa vida é em mto fruto da nossa inércia e que isso tem que mudar, porque realmente nada cai do céu e tenho a vaga impressão que atingimos o chão. Há um mundo inteiro à nossa espera. Raquel, temos de sair de casa... Sei que nada do que te possa dizer vai colmatar a solidão ou a angústia e que as minhas palavras são vazias e pobres. Mas acredita que sei o que sentes, porque eu sinto o mesmo. E como tu mesmo disseste são as pequenas coisas que nos sustentam.

Mil Beijos

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